Justiça determina EXCLUSÃO de pai registral e inclusão de pai BIOLÓGICO em certidão de nascimento
- Thales de Menezes
- 4 de jun. de 2023
- 6 min de leitura
Atualizado: 10 de nov.

O Tribunal de Justiça de Alagoas (TJ/AL) decidiu, de forma unânime, pela alteração de registro civil de uma jovem, substituindo o nome do pai registral pelo do pai biológico. A decisão reafirma o princípio da verdade biológica e o direito à identidade pessoal, ambos reconhecidos pela Constituição Federal e pela Lei de Registros Públicos.
No caso, o pai biológico ingressou com ação judicial pedindo a retificação do registro civil da filha. Ele alegou que o pai registral, que a registrou ainda bebê, nunca criou vínculo afetivo com ela. O pedido havia sido negado na primeira instância, mas foi reformado pela 4ª Câmara Cível do TJ/AL, sob relatoria do desembargador Fábio Ferrario.
A decisão reforça que o direito ao nome e à filiação não é apenas formal. É também um direito da personalidade, vinculado à dignidade da pessoa humana e à verdade dos laços afetivos e biológicos. Assim, a alteração de registro civil é instrumento legítimo para corrigir divergências entre a realidade fática e o registro oficial.
O fundamento constitucional do direito à filiação e à identidade
A Constituição Federal de 1988 assegura a proteção à dignidade humana e ao direito à identidade. O artigo 1º, inciso III, estabelece que a dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da República. Já o artigo 5º, inciso X, garante o direito à intimidade, à vida privada e à imagem das pessoas.
O artigo 227, §6º da Constituição também dispõe que “os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.
Esses dispositivos servem de base para reconhecer que o direito à filiação é um elemento essencial da identidade pessoal. Por isso, a Justiça tem autorizado a alteração do registro civil sempre que a realidade biológica ou afetiva não coincide com o que consta no documento.
A legislação aplicável à alteração de registro civil
O artigo 57 da Lei nº 6.015/1973 (Lei de Registros Públicos) dispõe que:“Qualquer alteração posterior de nome, somente por exceção e motivadamente, após audiência do Ministério Público, será permitida por sentença do juiz competente, com motivo justo e ponderado.”
Além disso, o artigo 109 da mesma lei prevê que “quem se julgar prejudicado com o registro poderá reclamar sua retificação ao juiz competente”.
Esses dispositivos dão amparo à decisão do Tribunal, pois a alteração foi motivada por fato concreto e legítimo: a inexistência de vínculo afetivo com o pai registral e a consolidação da relação paterna com o pai biológico.
O juiz, nesse tipo de processo, deve ponderar entre o princípio da estabilidade dos registros públicos e o princípio da verdade real. Quando o registro não reflete a realidade, a alteração é medida de justiça e preserva a dignidade da pessoa envolvida.
A importância do vínculo afetivo na definição da paternidade
O conceito de paternidade evoluiu no Direito brasileiro. Antes, prevalecia a paternidade exclusivamente biológica. Hoje, o ordenamento jurídico reconhece também a paternidade socioafetiva, que decorre do vínculo construído pela convivência, pelo cuidado e pela presença.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento consolidado nesse sentido. Segundo a Súmula 83, “a paternidade socioafetiva declarada ou não em registro público não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.
No entanto, a decisão do TJ/AL destacou que, neste caso, não havia paternidade socioafetiva entre a jovem e o pai registral. A jovem afirmou em audiência que nunca teve qualquer contato com ele desde o primeiro ano de vida. Por outro lado, o pai biológico participou de toda sua formação, assumindo os deveres morais e emocionais da paternidade.
Dessa forma, não se trata de um caso de multiparentalidade, mas de substituição do nome do pai registral por aquele que efetivamente exerceu a função paterna.
O papel da multiparentalidade e a diferença para o caso julgado
A multiparentalidade ocorre quando o filho mantém, simultaneamente, dois vínculos de filiação: um biológico e outro socioafetivo. O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu essa possibilidade no Recurso Extraordinário nº 898.060, com repercussão geral.
Na ocasião, o STF decidiu que “a paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios”.
Entretanto, o caso analisado pelo TJ/AL é distinto. Segundo o relator, “não há que se falar em multiparentalidade porque, para a apelada, só há um único pai, o recorrente”.
Assim, o Tribunal considerou que a manutenção do nome do pai registral geraria constrangimentos e distorções na vida civil da jovem. O registro, em vez de refletir a verdade, criava um obstáculo ao reconhecimento jurídico da sua realidade familiar.
A revelia do pai registral e a ausência de pretensão resistida
Um ponto relevante do acórdão foi a constatação de que o pai registral não demonstrou qualquer interesse em manter o vínculo jurídico. Apesar de devidamente citado, ele não compareceu à audiência, o que levou o juiz a decretar sua revelia.
O desembargador Fábio Ferrario destacou que “não há interesse de nenhum dos envolvidos em manter o vínculo registral”. Em razão disso, o Tribunal concluiu que não existia pretensão resistida, ou seja, não havia oposição efetiva ao pedido do pai biológico.
Essa ausência de conflito reforçou a necessidade de corrigir o registro, garantindo à jovem o direito de ver reconhecida sua verdadeira filiação.
A relação entre o princípio da verdade real e o registro público
O registro civil de nascimento é um ato jurídico que tem como função comprovar a existência da pessoa e fixar seus vínculos familiares. Contudo, quando o registro diverge da realidade, a lei permite sua retificação para preservar a verdade real.
O princípio da verdade real é uma diretriz do Direito Registral e orienta o juiz a buscar a correspondência entre o documento e a realidade vivida.
A manutenção de um registro inverídico, como no caso do pai registral sem vínculo afetivo, fere a segurança jurídica e o direito à identidade. Por isso, a alteração de registro civil foi considerada a medida mais justa e adequada à situação.
A influência da afetividade e da função social da família
O artigo 226 da Constituição Federal reconhece a família como base da sociedade e afirma que ela deve receber especial proteção do Estado. A jurisprudência brasileira tem interpretado esse dispositivo de forma a incluir o princípio da afetividade como elemento estruturante das relações familiares.
Desse modo, a filiação não se limita à biologia, mas também à convivência, ao amor e ao cuidado. O caso julgado pelo TJ/AL demonstra a importância de reconhecer a afetividade como expressão da verdade familiar.
Contudo, quando o afeto e a biologia se encontram, como no caso do pai biológico que também exerceu a função paterna, a retificação do registro se torna não apenas possível, mas necessária.
A decisão e seus efeitos práticos
Com a decisão da 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Alagoas, o nome do pai biológico será incluído no registro civil da jovem, substituindo o do pai registral.
Esse ato tem efeitos imediatos. A partir da retificação, todos os documentos da jovem deverão refletir a nova realidade familiar, inclusive certidões e registros administrativos.
A decisão também tem valor simbólico. Ela reforça o entendimento de que o Direito deve servir à verdade e à dignidade da pessoa humana. O registro civil, mais do que um papel, deve refletir a história e a identidade de cada indivíduo.
Conclusão: pai BIOLÓGICO em certidão de nascimento
A alteração de registro civil é um instrumento essencial para garantir o direito à identidade e à dignidade pessoal. O caso decidido pelo Tribunal de Justiça de Alagoas demonstra a sensibilidade do Judiciário em equilibrar os princípios da estabilidade registral e da verdade real.
O reconhecimento do pai biológico, neste caso, não apenas corrige um erro formal, mas também restabelece a coerência entre a vida e o documento. A decisão que determina EXCLUSÃO de pai registral e inclusão de pai BIOLÓGICO em certidão de nascimento segue nesse sentido.
A Justiça reafirma, assim, que o direito à filiação não se resume à formalidade do registro, mas deve refletir a realidade biológica e afetiva do indivíduo. Essa decisão serve de exemplo para situações semelhantes, nas quais o afeto e a verdade devem prevalecer sobre a forma.
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