Produtor rural tem cobrança de dívida suspensa após frustração de safra
- Thales de Menezes
- 4 de mar.
- 4 min de leitura
Atualizado: 11 de set.

O tema crédito rural alongamento de dívidas ganhou destaque após decisão recente da 1ª Vara Cível de Uruaçu, em Goiás. O juiz Wilker Andre Vieira Lacerda suspendeu a cobrança de uma cédula de crédito rural contratada por um produtor de soja. O agricultor comprovou que perdeu 62% da área produtiva, situação que comprometeu sua capacidade de pagamento.
A decisão judicial reforça direitos já previstos em lei e na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que reconhece a possibilidade de alongamento das dívidas de crédito rural quando o produtor comprova perdas significativas.
Esse entendimento é fundamental para garantir a continuidade da atividade agrícola, setor essencial para a economia nacional.
O Crédito Rural e Sua Finalidade
O crédito rural é disciplinado pela Lei nº 4.829/1965, que em seu artigo 3º define:
“O crédito rural tem por finalidade fornecer recursos financeiros para aplicação exclusiva em atividades que se enquadrem nos objetivos indicados no artigo 1º desta lei.”
O artigo 1º destaca que o crédito rural visa:
“Estimular os investimentos rurais, inclusive para armazenamento, beneficiamento e industrialização dos produtos agropecuários, quando feitos pelo próprio produtor rural, cooperativas ou associações de produtores rurais.”
Assim, a lei garante ao produtor instrumentos financeiros para custeio, investimento e comercialização da produção. No entanto, como a atividade rural está sujeita a riscos climáticos e de mercado, o legislador também previu mecanismos de proteção em situações de inadimplência involuntária.
O Alongamento das Dívidas Rurais
O alongamento é a prorrogação do prazo de pagamento do crédito rural, concedida ao produtor em casos de dificuldades temporárias. O Decreto nº 167/1967, que regulamenta a Cédula de Crédito Rural, também prevê hipóteses de renegociação.
O Superior Tribunal de Justiça consolidou o tema na Súmula 298, que dispõe:
“O alongamento de dívida originada de crédito rural não constitui faculdade da instituição financeira, mas, direito do devedor, nos termos da lei.”
Isso significa que, quando o produtor comprova perda significativa da safra ou eventos climáticos que inviabilizam o pagamento, o banco não pode simplesmente negar a renegociação.
O objetivo é garantir que o agricultor não seja excluído do sistema produtivo por fatos que fogem ao seu controle.
O Caso do Produtor de Soja em Goiás
O agricultor contratou em 2021 uma cédula de crédito rural no valor de R$ 1,7 milhão, com pagamento parcelado em sete anos. Ele quitou as duas primeiras parcelas, mas, diante da perda de 62% da safra e da queda no preço da soja, não conseguiu honrar a parcela de 2024.
Após tentar renegociar administrativamente, sem sucesso, ingressou com ação judicial. Na petição, pediu a suspensão da cobrança, a proibição de negativação de seu nome e a preservação de seus bens contra penhora.
O juiz reconheceu a comprovação documental das perdas e aplicou a Súmula 298 do STJ. Com isso, concedeu liminar suspendendo a cobrança e impedindo medidas de restrição até a decisão final, sob pena de multa de R$ 500 por descumprimento.
Fundamentação Jurídica da Decisão
O magistrado destacou que a legislação prevê mecanismos de proteção para o agricultor que enfrenta dificuldades temporárias. O crédito rural deve cumprir sua finalidade social de fortalecer a produção agropecuária e não de inviabilizar a atividade do produtor.
A decisão se apoiou no entendimento de que o alongamento não é mera liberalidade do banco, mas sim um direito do devedor, quando preenchidos os requisitos legais.
Além disso, o Código Civil, em seu artigo 317, prevê a possibilidade de revisão contratual em situações de onerosidade excessiva:
“Quando, por motivos imprevisíveis, sobrevier desproporção manifesta entre o valor da prestação devida e o do momento de sua execução, poderá o juiz corrigi-lo, a pedido da parte, de modo que assegure, quanto possível, o valor real da prestação.”
Esse dispositivo reforça a proteção ao devedor em casos de eventos imprevisíveis, como perdas climáticas severas.
O Papel da Jurisprudência em frustração de safra
O STJ tem reiteradamente reconhecido o direito ao alongamento das dívidas rurais em casos de frustração de safra. Diversos precedentes confirmam que o banco não pode negar o pedido quando o produtor comprova a inviabilidade temporária de pagamento.
Em decisão recente, a Corte reafirmou que a comprovação da perda de safra, aliada à viabilidade do empreendimento em longo prazo, garante ao agricultor o direito ao benefício.
Portanto, a liminar concedida em Goiás segue a orientação consolidada do tribunal superior, assegurando uniformidade na interpretação da lei.
A Importância Econômica e Social da Medida
O setor agropecuário representa parcela significativa do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. A inadimplência em massa de produtores rurais teria impacto direto no abastecimento interno e nas exportações.
O crédito rural alongado garante que o agricultor mantenha suas atividades e continue contribuindo para a economia. A medida também preserva empregos e fortalece o desenvolvimento regional.
Além disso, ao assegurar a renegociação, o Judiciário promove a função social do contrato, princípio consagrado no artigo 421 do Código Civil:
“A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.”
Portanto, a decisão protege não apenas o interesse individual do produtor, mas também o interesse coletivo no fortalecimento da produção agrícola.
Limites e Condições do Alongamento
O direito ao alongamento exige comprovação objetiva das dificuldades. No caso analisado, o produtor apresentou laudos técnicos que atestaram a perda de mais da metade da produção.
Além disso, demonstrou que tentou renegociar administrativamente antes de recorrer ao Judiciário. Esses elementos foram fundamentais para convencer o juiz da boa-fé do agricultor.
O benefício não se aplica quando a inadimplência decorre de má gestão ou simples descumprimento contratual sem justificativa plausível. O direito existe para casos de dificuldades imprevisíveis e temporárias.
Conclusão
O crédito rural alongamento de dívidas é um instrumento essencial para proteger os agricultores contra riscos climáticos e de mercado. A decisão da 1ª Vara Cível de Uruaçu reforça a aplicação da Súmula 298 do STJ e garante que o produtor em dificuldade temporária não seja excluído da atividade produtiva.
O Judiciário tem papel fundamental em assegurar que os contratos de crédito rural cumpram sua função social, permitindo que os agricultores superem crises sem perder sua capacidade de produzir.
Assim, a decisão judicial representa não apenas a proteção de um direito individual, mas também a preservação de um setor estratégico para a economia brasileira.
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