STJ não permite PENHORA DE APOSENTADORIA para quitar honorários
- Thales de Menezes
- 4 de jun. de 2023
- 5 min de leitura
Atualizado: 10 de nov.

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça reacendeu o debate sobre os limites da penhora de aposentadoria e a proteção da verba alimentar. O ministro Moura Ribeiro, relator do caso, entendeu que é impenhorável a aposentadoria do devedor, mesmo quando a dívida decorre de honorários advocatícios sucumbenciais.
Essa decisão é relevante porque reafirma o caráter alimentar das verbas recebidas a título de aposentadoria, protegendo o mínimo existencial do devedor. Ao mesmo tempo, impõe limites à execução de créditos advocatícios, mesmo sendo também de natureza alimentar.
O que diz a lei sobre a penhora de aposentadoria
A regra geral sobre impenhorabilidade está prevista no artigo 833, inciso IV, do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que dispõe:
“São impenhoráveis: IV – os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios, bem como as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e de sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, ressalvado o § 2º.”
O § 2º do mesmo artigo estabelece uma exceção:
“O disposto nos incisos IV e X do caput não se aplica à hipótese de penhora para pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem, bem como às importâncias excedentes a cinquenta salários-mínimos mensais, devendo, em qualquer caso, ser preservado o mínimo existencial.”
A partir dessa redação, surgiram dúvidas sobre a possibilidade de penhorar parte da aposentadoria para quitar honorários advocatícios, já que estes também possuem natureza alimentar.
A natureza alimentar dos honorários advocatícios
Os honorários advocatícios são uma forma de remuneração do advogado pelo trabalho prestado. Eles estão previstos no artigo 85 do Código de Processo Civil, que dispõe:
“A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor.”
Além disso, o artigo 22 da Lei nº 8.906/94 (Estatuto da Advocacia e da OAB) afirma que
“a prestação de serviço profissional assegura aos inscritos na OAB o direito aos honorários convencionados, aos fixados por arbitramento judicial e aos de sucumbência”.
O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça reconhecem que os honorários advocatícios possuem natureza alimentar, pois correspondem à remuneração do trabalho do advogado. Entretanto, o STJ tem entendido que essa natureza não os equipara às verbas destinadas à subsistência direta do devedor e de sua família, como salário e aposentadoria.
Assim, embora ambos sejam créditos de caráter alimentar, eles possuem finalidades distintas.
A decisão do STJ sobre a impenhorabilidade da aposentadoria
No caso julgado, o ministro Moura Ribeiro, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), entendeu que não é possível a penhora de aposentadoria para pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais.
Segundo o relator, a decisão de origem contrariava a orientação da Corte Especial do STJ, que consolidou entendimento no sentido de que não se pode mitigar a impenhorabilidade da remuneração do devedor para pagamento de honorários advocatícios.
Em suas palavras, o ministro afirmou:
“O acórdão recorrido encontra-se em desacordo com a orientação recentemente firmada pela Corte Especial desta egrégia Corte Superior, a qual já se manifestou pelo descabimento de mitigação da impenhorabilidade de remuneração do devedor quando se tratar de crédito lastreado em honorários advocatícios.”
Com base nisso, o STJ deu provimento ao recurso, reconhecendo a impossibilidade de penhorar parte da aposentadoria do devedor, mesmo diante de honorários de sucumbência.
Fundamentos constitucionais da decisão
A decisão está em consonância com o artigo 7º, inciso X, da Constituição Federal, que protege o salário e, por analogia, outras verbas de caráter alimentar:
“São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: X – proteção do salário na forma da lei, constituindo crime sua retenção dolosa.”
A jurisprudência constitucional entende que a aposentadoria se equipara ao salário para fins de proteção jurídica, pois ambos garantem a subsistência do indivíduo e de sua família.
O artigo 1º, inciso III, da Constituição Federal, também serve de fundamento, ao consagrar a dignidade da pessoa humana como um dos pilares da República. Permitir a penhora de aposentadoria comprometeria a dignidade do devedor, privando-o dos meios necessários à sobrevivência.
A exceção legal e sua interpretação restritiva
O §2º do artigo 833 do CPC prevê uma exceção à regra da impenhorabilidade, permitindo a penhora para o pagamento de prestação alimentícia, independentemente de sua origem.
No entanto, o STJ tem interpretado essa exceção de forma restritiva. A prestação alimentícia referida na norma é aquela voltada à subsistência direta de quem depende do crédito para sobreviver — como pensão alimentícia de filhos ou ex-cônjuges — e não créditos decorrentes de atividade profissional.
Essa distinção foi reafirmada no REsp 1.874.222/SP, julgado pela Corte Especial, que fixou a seguinte tese:
“É impenhorável a verba remuneratória, ainda que parcialmente, para pagamento de honorários advocatícios, contratuais ou sucumbenciais, por não se equipararem às prestações alimentícias de que trata o § 2º do art. 833 do CPC.”
Essa decisão passou a orientar os tribunais inferiores, garantindo uniformidade e segurança jurídica na aplicação do direito.
A função social da impenhorabilidade
A impenhorabilidade da aposentadoria e de outras verbas alimentares não é um privilégio pessoal, mas uma garantia mínima de sobrevivência. O direito processual busca equilibrar a satisfação do crédito com a proteção do devedor contra a perda de sua subsistência.
A função social da impenhorabilidade é evitar que a execução se torne um instrumento de miséria. O Estado deve assegurar que o devedor mantenha recursos mínimos para viver com dignidade, mesmo diante de suas obrigações financeiras.
O STJ, em reiteradas decisões, tem afirmado que a penhora de salário ou aposentadoria só pode ocorrer em casos excepcionais, como para pagamento de pensão alimentícia, em que há um conflito direto entre duas necessidades vitais.
Impactos práticos da decisão
A decisão do STJ traz consequências diretas para advogados e credores em geral. A partir dela, não é possível penhorar aposentadoria, ainda que parcialmente, para pagamento de honorários advocatícios.
Isso significa que, mesmo que o advogado tenha obtido uma condenação judicial em seu favor, não poderá atingir valores recebidos a título de aposentadoria pelo devedor.
Na prática, o credor deverá buscar outros bens penhoráveis — como imóveis, veículos ou contas bancárias com valores não vinculados à subsistência — para satisfazer o crédito.
Diferença entre penhora de aposentadoria e de poupança
É importante distinguir a impenhorabilidade da aposentadoria da impenhorabilidade da poupança. Embora ambas estejam protegidas pelo artigo 833 do CPC, o fundamento é distinto.
A aposentadoria é protegida por seu caráter alimentar, enquanto a poupança goza de proteção patrimonial limitada. O inciso X do artigo 833 estabelece que são impenhoráveis “a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 salários-mínimos”.
Portanto, valores depositados em conta corrente ou poupança que superem esse limite podem ser penhorados, desde que não se confundam com proventos de aposentadoria.
Quando a penhora de aposentadoria é possível
A única hipótese legal que autoriza a penhora de aposentadoria é o pagamento de pensão alimentícia, nos termos do §2º do artigo 833 do CPC.
Essa exceção se justifica porque há uma contraposição entre duas verbas de natureza alimentar: a do devedor e a do alimentando. Nesses casos, o Estado prioriza a subsistência do alimentando, que geralmente se encontra em situação mais vulnerável.
Mesmo assim, a penhora deve ser proporcional e razoável, garantindo que o devedor mantenha o mínimo necessário para sua sobrevivência.
Conclusão
A decisão do ministro Moura Ribeiro consolida o entendimento de que a penhora de aposentadoria para pagamento de honorários advocatícios é ilegal. O STJ reafirma a proteção do caráter alimentar da aposentadoria, evitando que o devedor fique desprovido de meios de subsistência.
Ainda que os honorários tenham natureza alimentar, eles não se confundem com a finalidade vital da aposentadoria. O sistema jurídico busca proteger a dignidade humana e preservar o mínimo existencial.
A decisão também reforça a importância da boa-fé nas execuções, evitando o uso excessivo de meios coercitivos que comprometam direitos fundamentais. Em suma, a penhora de aposentadoria permanece impenhorável, salvo para pagamento de pensão alimentícia, conforme estabelece a lei e reafirma a jurisprudência do STJ.
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