STJ: Uso do salário-mínimo como indexador não justifica inadimplência em contratos imobiliários
- Thales de Menezes
- 9 de mar.
- 4 min de leitura
Atualizado: 10 de set.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu recentemente que o uso do salário-mínimo como indexador de correção monetária não justifica a inadimplência em contratos imobiliários. Essa decisão da Terceira Turma tem impacto direto na interpretação de contratos de promessa de compra e venda, principalmente aqueles firmados em períodos de instabilidade econômica. O entendimento reforça que a correção monetária tem a função de preservar o valor da obrigação, mas não autoriza o descumprimento contratual. Assim, o STJ reafirma a importância da boa-fé e da adimplência, mesmo diante de revisões judiciais sobre cláusulas contratuais.
O caso analisado pelo STJ
O julgamento envolveu contratos celebrados em 1988 entre uma imobiliária e membros de uma associação. Os contratos foram posteriormente alterados para atualização de índices, diante da instabilidade econômica da época. No entanto, os compradores ingressaram com ação revisional, alegando a ilegalidade da vinculação ao salário-mínimo como indexador.
O tribunal de origem entendeu que a cláusula era ilegal, substituiu o índice de correção e afastou a mora dos devedores. A decisão gerou questionamentos, levando a parte credora a recorrer ao STJ.
A fundamentação do STJ
Ao analisar o recurso, a ministra Nancy Andrighi destacou que a jurisprudência do STJ já é pacífica quanto à impossibilidade de afastar a mora apenas pela constatação de encargos abusivos. Esse entendimento, antes aplicado a contratos bancários, foi estendido aos contratos imobiliários.
Segundo a relatora, a correção monetária não representa vantagem para o credor, mas apenas a atualização do valor do dinheiro. Sem a atualização, ocorreria enriquecimento sem causa do devedor, o que é vedado pelo ordenamento jurídico.
A ministra ressaltou ainda que os compradores estavam adimplentes até o ajuizamento da ação revisional, mas deixaram de pagar as parcelas na expectativa de uma decisão judicial favorável. Mesmo que a cláusula de indexação fosse considerada ilegal, a inadimplência não se justificaria.
A importância da correção monetária
A correção monetária é instrumento essencial para preservar o poder de compra do valor devido. Ela não cria acréscimos indevidos, mas apenas mantém o equilíbrio do contrato. O artigo 389 do Código Civil determina:
Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.
Portanto, a atualização dos valores devidos em contratos imobiliários é obrigação legal. Ela protege o credor contra desvalorização e impede que o devedor obtenha vantagem indevida ao pagar valores defasados.
Mora em contratos imobiliários
A mora é o atraso no cumprimento da obrigação contratual. O artigo 394 do Código Civil dispõe:
Considera-se em mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que não quiser recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.
Assim, a mora do comprador em contratos imobiliários ocorre quando há atraso ou inadimplemento das parcelas pactuadas. O afastamento da mora só é admitido em situações excepcionais, quando o contrato causa onerosidade excessiva ou desequilíbrio entre as partes.
No caso julgado, o STJ reconheceu que não houve prova de onerosidade excessiva. A simples utilização do salário-mínimo como indexador não afasta a obrigação de pagar as parcelas.
O princípio da boa-fé objetiva
A decisão também reforça a aplicação do princípio da boa-fé objetiva, previsto no artigo 422 do Código Civil:
Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé.
No caso, os compradores deixaram de pagar as parcelas confiando em uma possível decisão judicial favorável. O STJ entendeu que essa conduta violou o dever de boa-fé, pois não houve autorização legal para o inadimplemento.
Revisão de cláusulas contratuais
É possível revisar cláusulas contratuais que se mostrem abusivas ou ilegais. O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) em seu artigo 51, inciso IV, estabelece:
São nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a equidade.
Entretanto, mesmo diante da revisão de cláusulas, o cumprimento das obrigações principais deve ser mantido. O inadimplemento não se justifica pelo simples fato de haver uma ação revisional em andamento.
Segurança jurídica nos contratos imobiliários
A decisão do STJ tem relevância porque reafirma a segurança jurídica nos contratos imobiliários. A previsibilidade e a estabilidade dos contratos garantem confiança nas relações econômicas.
Se fosse admitido que a mera discussão judicial afastasse a mora, haveria incentivo ao descumprimento generalizado das obrigações. Isso traria insegurança para o mercado imobiliário, prejudicando compradores e vendedores.
Portanto, o julgamento serve de parâmetro para casos futuros, reafirmando que a adimplência é regra, e a inadimplência só se justifica diante de onerosidade excessiva comprovada.
Consequências da inadimplência
O inadimplemento contratual gera diversas consequências jurídicas. Além da cobrança judicial, o comprador inadimplente pode perder o imóvel em contratos de promessa de compra e venda.
A Lei nº 6.766/79, que dispõe sobre o parcelamento do solo urbano, prevê em seu artigo 32:
Considerar-se-á rescindido de pleno direito o compromisso de compra e venda, a cessão ou promessa de cessão quando, decorrido o prazo de 30 dias da notificação, não tiver o comprador purgado a mora.
Dessa forma, a inadimplência persistente pode resultar na perda do direito ao imóvel, além de indenizações e encargos adicionais.
Conclusão
O julgamento do STJ reafirma a importância da adimplência e da boa-fé nas relações contratuais. A utilização do salário-mínimo como indexador não é suficiente para afastar a mora em contratos imobiliários.
A decisão fortalece a segurança jurídica, protege o equilíbrio contratual e garante que credores não sejam prejudicados por inadimplência injustificada. Ao mesmo tempo, preserva a possibilidade de revisão de cláusulas abusivas, sem comprometer o núcleo da obrigação contratual.
Esse precedente demonstra que a boa-fé deve orientar tanto credores quanto devedores, assegurando que os contratos cumpram sua função social e econômica.
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