A Dispensa do Exame de Ordem para Estagiários: Uma Análise do Artigo 84 do Estatuto da Advocacia
- Thales de Menezes
- 16 de abr.
- 4 min de leitura
O exercício da advocacia no Brasil exige, normalmente, aprovação no Exame de Ordem como requisito fundamental para a inscrição nos quadros da OAB. No entanto, o artigo 84 do Estatuto da Advocacia e da OAB (Lei nº 8.906/1994) trouxe uma exceção temporária a essa regra, estabelecendo uma forma alternativa de ingresso na carreira para estagiários inscritos. Vamos analisar detalhadamente este dispositivo legal, sua aplicação e as implicações éticas relacionadas.
O texto legal e seu contexto
O artigo 84 do Estatuto da Advocacia e da OAB estabelece:
"Art. 84. O estagiário, inscrito no respectivo quadro, fica dispensado do Exame de Ordem, desde que comprove, em até dois anos da promulgação desta lei, o exercício e resultado do estágio profissional ou a conclusão, com aproveitamento, do estágio de Prática Forense e Organização Judiciária, realizado junto à respectiva faculdade, na forma da legislação em vigor."
Este artigo criou uma janela de oportunidade para estagiários inscritos no quadro da OAB, permitindo que dispensassem o Exame de Ordem mediante a comprovação de experiência prática. É importante ressaltar que esta disposição tinha caráter transitório, com prazo de dois anos a partir da promulgação da lei em 4 de julho de 1994. Portanto, tal benefício se encerrou em julho de 1996, não estando mais disponível para estagiários atuais que buscam especialização em áreas como direito imobiliário.
Requisitos para a dispensa do Exame de Ordem segundo o artigo 84
Para usufruir da dispensa prevista no artigo 84, o estagiário precisava atender a requisitos específicos:
Estar inscrito no quadro de estagiários da OAB;
Comprovar, dentro do prazo de dois anos da promulgação da lei (até julho de 1996):
O exercício e resultado satisfatório do estágio profissional; ou
A conclusão, com aproveitamento, do estágio de Prática Forense e Organização Judiciária realizado na faculdade de Direito.
Esta comprovação deveria ser feita conforme a legislação vigente à época, respeitando os parâmetros estabelecidos pelo Conselho Federal da OAB. A dispensa representou um reconhecimento da experiência prática adquirida pelos estagiários, considerando que a vivência forense poderia substituir a necessidade de demonstração de conhecimentos através do exame, à semelhança do que ocorre em áreas especializadas como o direito sucessório.
Aspectos éticos relacionados à dispensa do Exame
Do ponto de vista ético, esta disposição transitória levanta algumas reflexões importantes. O Código de Ética e Disciplina da OAB sempre enfatizou a importância da qualificação técnica e do preparo adequado para o exercício da advocacia. A dispensa do Exame de Ordem não significava, portanto, uma isenção do dever de competência profissional.
Os estagiários beneficiados pelo artigo 84 permaneciam sujeitos aos mesmos deveres éticos e à mesma responsabilidade profissional que os demais advogados. O exercício da advocacia, independentemente da forma de ingresso na carreira, exige conduta ética irrepreensível, preparo técnico adequado e compromisso com o aperfeiçoamento contínuo, conforme discutimos em diversas publicações de nosso blog.
Impacto histórico e comparativo com a situação atual
É interessante comparar esta disposição transitória com as regras atuais para ingresso na advocacia. Hoje, o Exame de Ordem é requisito inafastável para todos os bacharéis em Direito que desejam exercer a profissão, não havendo mais a possibilidade de dispensa baseada na experiência de estágio.
Esta mudança reflete a crescente preocupação com a qualidade técnica dos profissionais que ingressam no mercado jurídico. O Exame de Ordem consolidou-se como instrumento de verificação de conhecimentos mínimos necessários ao exercício da advocacia, contribuindo para a credibilidade da profissão e proteção dos interesses dos cidadãos que buscam serviços jurídicos especializados, como aqueles relacionados a inventários e partilhas.
Considerações sobre a natureza transitória do artigo 84
A natureza transitória do artigo 84 demonstra que o legislador considerou a dispensa do Exame de Ordem como uma situação excepcional, aplicável apenas a um contexto histórico específico de transição entre regimes jurídicos. A opção por limitar o benefício a dois anos após a promulgação da lei evidencia a preocupação em estabelecer um período definido para adaptação às novas regras.
Esta disposição se insere no contexto das Disposições Gerais e Transitórias do Estatuto, capítulo que visa regular situações de transição entre o regime anterior e o novo ordenamento jurídico da advocacia. O caráter excepcional da norma reforça a regra geral de que o acesso à advocacia deve ser criterioso e baseado em parâmetros objetivos de avaliação de conhecimentos, como é o caso do Exame de Ordem, tema frequentemente debatido em ambientes de coworking jurídico.
Relevância do artigo 84 para a formação da identidade profissional
Embora não mais aplicável, o artigo 84 possui relevância histórica na formação da identidade profissional da advocacia brasileira. Ele marca um momento de transição na regulamentação da profissão e reflete a evolução do pensamento sobre os requisitos necessários para o exercício da advocacia.
A compreensão deste dispositivo permite entender melhor o processo histórico de consolidação das regras de acesso à advocacia e a crescente valorização da capacitação técnica dos profissionais. Para os advogados contemporâneos, o conhecimento desta disposição transitória oferece uma perspectiva valiosa sobre a evolução das normas profissionais, especialmente para aqueles dedicados a áreas específicas como a advocacia imobiliária.
Conclusão
O artigo 84 do Estatuto da Advocacia e da OAB representou uma medida transitória que permitiu a dispensa do Exame de Ordem para estagiários que comprovassem experiência prática, dentro de um prazo específico. Embora não mais vigente, este dispositivo tem importância histórica e oferece lições valiosas sobre a evolução das regras de acesso à profissão.
A análise deste artigo no contexto do Código de Ética da OAB reforça que, independentemente da forma de ingresso na carreira, todos os advogados estão sujeitos aos mesmos deveres éticos e à mesma responsabilidade profissional. O compromisso com a qualificação técnica e com a conduta ética irrepreensível permanece como pilar fundamental da advocacia, transcendendo as mudanças nas regras de acesso à profissão.
Compreender estas disposições transitórias e sua evolução histórica contribui para uma prática profissional mais consciente e eticamente responsável, sempre em consonância com os valores e princípios que regem a nobre função de advogado na sociedade brasileira.
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